Receção intimidante
Hoje saí de casa com a mesma tranquilidade de quase todos os dias, de quem está a horas, aliviada por não chover. Chego à Praça da República e vejo agentes da polícia, de ambos os lados da estrada, entre eles dois metros de distância, trânsito cortado. Pensei que aquele podia ser parte do trajeto de uma manifestação. Senti-me quase como se estivesse a cometer um crime ao atravessar na passadeira com o sinal dos peões vermelho, felizmente nenhum dos muitos agentes se deu ao trabalho de me prender. No último degrau das Monumentais até prendi a respiração durante um segundo, mais e mais polícias, canhões apontados diretamente a mim, grupos de militares de postura rija e hirta, agentes das forças de intervenção armados até aos dentes. Foi quando me me lembrei do porquê de tanto aparato, começou hoje em Coimbra a visita oficial de dois dias do presidente grego. Fiz o trajeto até ao meu departamento acompanhada pelo único som que pairava no ar, o das minhas botas a bater no asfalto (esta deve ser muito provavelmente uma das sensações finais dos condenados à morte).
A meio da manhã começou a receção com honras de estado, a banda toca, desfilam dezenas de cavalos com exuberantes cavaleiros a preceder a frota automóvel topo de gama, ao longe mas ainda discernível vi o carro do Marcelo, pouco tempo depois o som dos canhões ecoa no ar. Durou tudo muito pouco tempo, foi bem maior o aparato. Acho que a cidade nunca se viu no meio de tanto protocolo presidencial. Eu safei-me, mas para muitos foi uma manhã caótica, o centro histórico estava uma fortaleza, como não estaria o trânsito. Aos estudantes de direito pedia-se os olhos bem abertos e apontados para o chão para não pisarem os presentes deixados pela cavalaria, o único vestígio que restou da calorosa receção.