"Sismo à italiana" é o cartoon do polémico jornal satírico Charlie Hebdo que está a enfurecer os italianos a indignar o resto do mundo. Às vítimas são atribuídos nomes de pratos típicos, o homem ensanguentado é legendado como penne com molho de tomate, a mulher com o rosto queimado é descrita como penne gratinado, e o pior é quando a sátira atinge às vitimas mortais, numa alternância de camadas de escombros e pessoas, foi-lhes dado o nome de lasanha.
Isto é uma provocação, é simplesmente insensibilidade e desrespeito pela dor e sofrimento alheio, é macabro demais para ser considerado humor. Ninguém gozou quando o jornal francês sofreu um ataque terrorista em janeiro do ano passado. Todos juntaram as suas vozes em defesa da liberdade de expressão, porque criticar muçulmanos, refugiados e negros é muito aceitável, e resultou tão bem que o jornal sentiu-se livre para gozar com outros mortos. Desta vez os ridicularizados são também vítimas, mas cidadãos europeus, aí é um caso à parte, os envolvidos na publicação passam a ser seres desprezíveis de corpos ocos, sem coração, que mereceram totalmente o ataque. Porque quando foram os colegas jornalistas que faleceram não foi feita nenhuma caricatura do caso.
Infelizmente é esta a linha editorial do jornal, a controvérsia e polémica, que se sobrepõem aquela que deveria ser a principal característica, o humor, ainda que satírico. Eu considero haver três grandes tipos de humor. O humor para rir, com piadas mais banais que por isso acabam por ser engraçadas ou piadas apalhaçadas, que são exageradas, elaboradas ou tão destrambelhadas que é impossível ficar indiferente. O humor satírico, que alegadamente é o que o jornal segue, cuja ridicularização de uma pessoa, comportamento, situação,..., tem como objetivo incitar uma mudança. À sátira eu associo uma expressão latina Ridendo castigat mores (a rir se castigam os costumes). O que é que se poderia a satirizar nesta situação, a Natureza? Imprevisível, incontrolável e imutável. Não dá, a solução foi mesmo recorrer a uma técnica mesquinha e baixa para vender. O que me leva ao último tipo, o humor negro, aquelas piadas "coisas" (à falta de melhor termo) de extremo mau gosto em que mesmo muita gente pense, ninguém diz, ou quando raramente ditas são logo condenadas por quem as ouve, mesmo que tenha tido alguma graça, porque a boa índole assim o dita. Dito isto tenho a dizer que este cartoon reflete humor buraco negro, suga toda a resquícia parte de comicidade.
Je ne suis pas Charlie porque nunca o fui, nunca poderia ter sido cúmplice deste tipo de atrocidade seja com quem for.